STJ flexibiliza a recuperação extrajudicial: quórum pode ser por “grupos” semelhantes e é válido aditar o plano antes da homologação
- Hian Matheus Corrêa Miranda

- 3 de set.
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A Quarta Turma do STJ, ao julgar o REsp 2.032.993/MG, consolidou entendimentos que tornam a recuperação extrajudicial mais eficiente e aderente à sua natureza contratual. Em síntese, o Tribunal reconheceu que o quórum de aprovação do plano pode ser apurado não apenas pelas classes legais, mas também por “grupos” de credores formados conforme a semelhança da natureza do crédito e das condições de pagamento. Além disso, reafirmou que o controle judicial sobre o plano restringe-se à legalidade — sem reprecificar condições econômicas negociadas — e admitiu o aditamento do plano antes da homologação para sanar vícios e viabilizar a aprovação.
Pelo art. 163 da Lei 11.101/2005, a homologação impositiva (o chamado cram down extrajudicial) depende da adesão de “mais da metade” dos créditos de cada espécie sujeita ao plano. O STJ esclareceu que, na via extrajudicial, “espécie” não se confunde mecanicamente com as classes da recuperação judicial. O devedor pode estruturar “grupos” de credores que compartilhem natureza semelhante de créditos e condições homogêneas de pagamento; dentro desses grupos é que se mede o quórum. Essa leitura prestigia a autonomia privada, simplifica a engenharia de acordos e evita distorções quando a realidade negocial não se encaixa perfeitamente nas classes legais.
Outro ponto relevante é a possibilidade de reunir credores quirografários e micro e pequenas empresas em um mesmo grupo, desde que haja homogeneidade material — isto é, créditos comparáveis e tratamento econômico semelhante. Na recuperação extrajudicial, onde prevalece a lógica contratual, tal aglutinação é admissível e pode ser decisiva para atingir o quórum qualificado sem criar privilégios arbitrários entre credores equivalentes.
Quanto ao papel do Judiciário, o acórdão enfatiza que a análise judicial tem natureza estritamente formal e de legalidade. Não cabe ao juiz reavaliar deságios, prazos, índices de correção ou demais condições econômicas livremente pactuadas pelos credores aderentes. O que se examina é a observância das regras legais: publicidade adequada, correta sujeição de créditos, inexistência de tratamento abusivo, regularidade das convocações e a verificação do quórum. Esse balizamento dá previsibilidade às negociações e reduz o risco de intervenção judicial no mérito econômico do acordo.
O Tribunal também reconheceu a possibilidade de aditamento do plano antes da homologação. Se o juízo identificar algum vício sanável — por exemplo, uma impropriedade formal ou um ponto de legalidade que possa ser ajustado —, é legítimo permitir que o devedor apresente ajustes no mesmo processo. Com isso, evita-se reiniciar todo o procedimento, economizam-se tempo e custos e preserva-se o avanço negocial já obtido com os credores.
No caso concreto, o STJ conheceu em parte e negou provimento ao recurso, aplicando filtros tradicionais: matérias que demandariam reexame de provas foram obstadas pela Súmula 7/STJ, e alegações dissociadas da norma indicada esbarraram na Súmula 284/STF. O resultado reforça a importância de formular teses estritamente jurídicas e bem delimitadas quando se discute a legalidade do plano.
Do ponto de vista prático, a decisão oferece um roteiro claro para devedores e credores. Vale mapear, já no pré-filing, grupos de credores com créditos e condições semelhantes, para otimizar o quórum; redigir o plano contemplando rotas de aditamento que permitam correções sem alterar a essência do acordo; e produzir uma prova documental robusta do quórum, com planilhas e critérios transparentes. Ao mesmo tempo, é prudente concentrar a defesa na legalidade do procedimento — e não em disputas sobre preço, prazos ou deságios que foram livremente negociados.
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